Preferia quando era tudo azul. A terra era azul e os porcos eram azuis e o excremento que se me agarrava às botas era azul e o leite azul esguichava das vacas azuis para o balde azul. O moinho era azul, o cata-vento era azul, o som da ferrugem era azul e as ervas-daninhas azuis comiam-me os anos de azul. O fumo dos meus cigarros azuis era azul e as minhas unhas eram azuis e os lábios azuis com que me beijava o espelho azul tinham fome de azul e o azul era todo o alimento. Os cabrestos eram azuis e o burro era azul e a carroça azul tinha rodas azuis que me levavam pela estrada azul até ao mercado azul da cidade azul, onde comprava tudo o que era azul, comprava tudo. As casas eram azuis e os bares eram azuis e as bebidas eram azuis e as putas eram azuis e até um forasteiro como eu era azul. Depois, passou por aqui um chico-esperto e pôs tudo como está agora.
De e enquanto espero que me arranjem o esquentador penso em como será a vida depois do sol explodir (2015, do lado esquerdo)
02.06.2022
Oriana Alves
Sérgio Milhano, Pedro Baptista
PontoZurca