Stefan Zweig a Charlotte Altmann
O mundo não merece a nossa dor,
o mundo cheira mal, tem bolor,
o mundo coxeia como um cavalo morto,
nasceu direito, pôs-se torto,
e anda às contracurvas em auto-estrada
este mundo que não nos serve para nada,
o mundo nasce debaixo do céu
e põe-se atrás do mar,
é um homenzinho de chumbo
contra o qual apetece disparar
as balas da nossa raiva,
as penas do nosso riso,
os dentes da fome que nos mastiga o siso,
o mundo é uma coisa aderente
que se cola às solas dos sapatos
e que nos põe doentes,
a tresandar dos sovacos,
o mundo é um emprego remunerado com a morte
que apenas conforta a vida
quando à sorte cabe um amor
que não sare como uma ferida vulgar.
De A Dança das Feridas (2011, edição do autor)
21.06.2022
Oriana Alves
Sérgio Milhano, Pedro Baptista
PontoZurca